A minha infância foi marcada por personagens tão
extraordinárias quanto misteriosas. Nunca duvidei, nem duvido, das suas
existências, mas desconfio que estas histórias estão muito mal contadas, com
muitas lacunas por preencher, e com fortes indícios de muita javardice oculta
no meio disto tudo. Alguém me consegue explicar os gostos estranhíssimos da
Fada dos Dentes? Qual é verdadeira razão do Pai Natal distribuir tantas
prendas? E qual é a do Coelhinho da Páscoa? O que leva um roedor a distribuir
ovos pintados?
Nunca ninguém achou
esquisita aquela tara pelos dentes? O que a Fada faz com os dentes? Onde é que
elas os enfia? Isto tudo cheira a prostituição dentária. Ela paga para tê-los.
Tudo bem que gostos são gostos, e não se discutam, mas aquele fetiche dentário
é um pouco assustador. Não?

Quando chega o Domingo
de Páscoa não consigo deixar de pensar no Coelhinho da Páscoa e na sua estranha
ligação aos ovos de Páscoa. O que leva um coelho a distribuir ovos pintados? Outra
coisa que me intriga particularmente é saber onde ele arranjou os ovos?
Tal como os seus
comparsas de encantar, o Coelhinho da Páscoa sofre de um seríssimo desvio
sexual. É um tarado e por sinal infiel. Os coelhos são por natureza
poligâmicos, mas este, farto de relações estritas, decidiu arrastar a asa para
outros lados. E assim enveredou para uma relação, porca e badalhoca, mas
totalmente contranatura com aves.
O problema é que
nenhum animal está autorizado a procriar fora da sua espécie. Para desviar as
atenções alheias da sua vida de alegre e delirante concubinato, arranjou um
esquema brilhante e começou a distribuir a sua prole, os ovos do crime. Mas não
sem antes os embelezar dando-lhes um aspecto decorativo e insuspeito. E assim,
nasceram os ovos da Páscoa.
O Cronista da Parvoíce © 2014