quarta-feira, 10 de junho de 2020

Manel e Quim, Inventores de Português

O português é uma língua tramadíssima com inúmeras expressões idiomáticas estranhíssimas e palavras complicadíssimas devido aos seus significados múltiplos. e sendo ele a nossa cabeça. Sem falar nas palavras com múltiplos sentidos. Temos o caso da palavra “caso”, que caso não sabiam, pode ser usada de diversas formas, podendo inclusive, e é caso para dizer, tornar-se num caso sério de desentendimento. e vão provavelmente ficar com cara de caso, quando vos contar a história da senhora que tinha um caso com o carteiro. E o marido chateado, e para se vingar, armadilhou a mota do sacana. Acção que virou caso de polícia. Era caso para tanto? Não acredito! Mas como não fazer caso? 

E esse caso é apenas um em muitos. Eu gostava de ter estado presente quando decidiram atribuir os significados às palavras. Não estive presente, e por razoes óbvias, mas consigo imaginar as reuniões em essas atribuições ocorreram. Consigo regressar a um passado distante e visualizar os ilustres e intemporais, mas injustamente desconhecidos, Manuel de Sá Vasconcelos, o Manel, e Joaquim Nóbrega de Sousa, o Quim, empenhados nessa importantíssima tarefa. E como bons portugueses que são, estavam num tasco e obviamente embriagados quando o fizeram. Não podem ter sido doutra forma. 

- Ooooooooooh Quim! 

- Siiiim Manel! Onde está ele? Está aí? 

- Acabei de ter umas ideias de génio! 

- O génio da família não és tu! É o teu primo! O Luisinho Zaralho! Não o convidaste para vir cá ter connosco? 

- Convidei, mas disse-me que tem de escrever um poema para o rei. 

- Um poema? Sobre quê? 

- Acho que é sobre os descobrimentos! Ele ficou chateado comigo porque, segundo ele, não percebia a importância que sua obra iria ter para língua portuguesa. E até teve a ousadia de dizer que não éramos criativos. Ele quer criatividade. E o que nós somos?

- Nóóóóós! 

- Nós?! Devias ter dito: CRIATIVOS! Estás mesmo bêbado! Vamos dar-lhe tanta criatividade que... que... ele não tem olho para isto. Não tem olho para isto! Está boa!

- Não devias gozar com ele! Isso é bullying! Não se faz!

- Bu..quê? É para inventar palavras em português! Deixa-te de estrangeirismos!
Posso continuar com as minhas as ideias inovadoras? E vais dizer-me o que pensas delas? Como sabes a maçã vem da macieira, a pêra da pereira, a cereja da cerejeira, e assim sucessivamente. Seria espectável a oliveira dar… 

- Não sei… Olivas?! 

- Nada disso! Azeitonas! E esta fora de questão trocar oliveira por azeitoneira. É uma palavra sem glamour. Depois não digam que não sou criativo. Mas tenho mais ideias de onde essas vieram. 

- Então? 

- Lembras-te daquela tua invenção dos prefixos que invertem o significado das palavras? 

- Sim, lembro! Como o “de-” ou “des-”! Confinar e desconfinar! Uma é antónima da outra! 

- Confinar e desconfinar? O que é isso? 

- Ainda não sei, mas essas palavras podem dar jeito! 

- Ouve a minha ideia, como sabes falecer é morrer, agora desfalecer, que deveria ser o antónimo, nunca significara viver. Mais, e para complicar um pouco a coisa, quem desfalece pode vir a falecer. E depois não criativo! Zarolho do catano! 

Vendo a quantidade absurda que palavras e expressões que temos, as noites no tasco devem ter sido longas. 

O Cronista da Parvoíce © 2020

A Parvoíce Expressiva #12

sábado, 6 de junho de 2020

A Praia (Versão Pandémica)

O Verão é sinonimo de sol, muito calor, e logo de praia. Eu sei que ainda estamos na Primavera, mas com a abertura da época balnear, uma espécie de antestreia veranil, é oficial: já me posso perder pelos areeiros. E a verdade é que me perco muito frequentemente, não por falta de sentido de orientação, mas por falta de visão. Sou míope. Sempre que vou a água, perco-me no regresso à toalha. Não tenho culpa. Está tudo desfocado. E o que me aflige mais nesse desfoque, é quando estou no mar, não consigo apreciar devidamente as curvas das moças que me rodeiam. Claro que tenho estratégias para solucionar esse handicap, como simular que fui arrastado por uma onda para me aproximar delas com, ou sem, ondas. 

Para ser franco, não sou grande adepto do areal, mas é indubitavelmente fundamental para um dos meus hobbies veranis favoritos: o apalpanço mental. É mais forte do que eu adoro olhar para as beldades que se desfilam sobre a areia. Eu sei que este meu assédio sexual, mesmo que mental é um comportamento reprovável, mas em minha defesa apenas uso a minha imaginação. Fora da minha mente é totalmente inofensivo. Outro ponto ao meu favor é que essa prática é mais activa quando estou escondido nas dunas munidos dos meus binóculos. Também acredito que não assusto ninguém com os meus binóculos da Patrulha Pata e a minha toalha dos Faísca McQueen. Acho eu?! 

Com a chegada do bicho, e regras impostas para o suster, as minhas práticas veranis vão sofrer um abalo tremendo. Antes disto tudo, fazia manhãs na praia e tardes nas dunas. Se todos respeitarem o distanciamento social, e imaginando uma quase certa enchente na praia, duvido muito que, à tarde, tenha um espacinho nas dunas, para uma observação puramente científica das beldades que frequentam as praias. Vou ser obrigado à estar o tempo todo no areal. Nada de dunas! E como disse, frequentar a areia, não é algo que aprecio totalmente, e isso de apesar de gostar das dádivas visuais que o areal me oferece. A verdade é que areia provoca-me uma comichão incrível e não é fácil seduzir alguém na praia, algo já me é difícil em tempo normal, dificulta-se ainda mais se estiver a coçar as virilhas e afins. Sem esquecer que detesto a sensação de parecer que fui fustigado por um ataque epilético sub-abominável  (há muito que os abdominais não moram por estes lados e passaram a ser abomináveis) e isso sempre que tento expelir os grãos de areia dos meus calções. A areia pertence ao areal, não aos meus calções. Ponto. 

Eu também gosto de jogar a bola, ou com raquetes, mas agora isso também está proibido. Não é que tenha muito jeito, mas bolas que eram atiradas inadvertidamente perto das jeitosas, eram uma boa desculpa para me aproximar delas. Disse que não tenho muito jeito, mas é preciso pontaria para me aproximar sem atingi-las. Confesso que uma vez, acertei numa, e não é que ganhei para o susto. Quando ela se levantou, fiquei com medo, primeiro porque era feia e depois, porque faltava-lhe dentes. Que grande bolada!  Pensei eu! Queres ver que vou ter de pagar o dentista! Mas espera! Acertei-lhe na coxa, não fui eu que fiz isso! Depois lembrei-me que lhe tinha acertado na coxa. Ela olhou para mim e perguntou-me e se a bola era minha, e como é óbvio, respondi que não e fui comprar outra. Esse tipo de aproximações é sempre uma roleta russa. Nunca sei o que vou encontrar, mas como não tenho os óculos, não tenho como fazer de outra forma. 

Tenho o receio que devido ao calor, e com as mentes derretidas pelo mesmo, ninguém respeite o distanciamento social, mas tenho uma solução para isso: vou andar todo nu. Assim tenho a certeza que não haverá aproximações e acredito, que vão manter-se todos à uma distância considerável de mim. Nunca ninguém aproxima de mim quando estou nu. Ninguém mesmo. Nenhuma mulher. Pensando bem é estranho. Será que… 

O Cronista da Parvoíce © 2020